Thursday, November 5, 2009

Been There, Done That

Kings of Convenience, Coliseu Lisboa, 4 Novembro 2009

Simples, sereno, descontraído, simples, bonito, fluente, já disse simples? Acho que nunca tinha visto o Coliseu tão despido e simultaneamente tão cheio de alma. Duas pessoas normais, sem vedetismos, como qualquer um de nós encheram o palco do Coliseu para deslumbrar uma casa alimentada pela música cristalina vinda do norte da Europa. A primeira parte foi entregue à chilena Javiera Mena que se descolou do seu habitual electropop para mostrar o seu lado mais intimista, fazendo acompanhar-se só de piano e de guitarra. Erlend Øye e Eirik Glambek Bøe entraram em palco, depois de pedirem 40 minutos sem fotografias e começaram logo por criar a boa empatia com o público, empatia essa que se estendeu até ao fim do concerto. Revelaram-se uns verdadeiros entertainers e fizeram o que quiseram do público, sempre simpáticos, sempre cool e muito, muito à vontade para falar, desde a refeição que tinham comido à tarde até agradecerem aos portugueses por recebê-los tão bem. Por alguma razão Lisboa é a capital europeia onde já tocaram mais vezes, 4 ao todo, facto constatado pelo próprio Erlend.

Para ajudar a festa e a discorrer o repertório de canções, os noruegueses contaram com a participação de dois convidados de luxo – um alemão no violino e um italiano no contra-baixo – que contribuiram para o espectáculo ser completo e ainda mais efusivo emocionalmente. Passaram em revista todos os êxitos dos três álbuns, dando especial ênfase ao novo trabalho “Declaration of Dependence” como seria de esperar. O público, a príncipio meio tímido e talvez constrangido por tamanha simplicidade, acabou por ser aprendiz dos dois “nerds musicais” que ensinaram como acompanhar o ritmo da música com um singelo estalar de dedos, evitando as constantes palmas que acabavam por abafar as melodias. Assim foi, palmas só no fim das canções e acabaram por ser inevitáveis quando os músicos convidaram as pessoas para subir ao palco para acompanhar Erlend nas suas danças descoordenadas mas muito engraçadas. Depois de músicas como “Know-How”, sem Feist mas muito bem acompanhado por um público afinado, “I Don’t Know What I Can Save You From”, “Homesick”, “Mrs. Cold” ou “Boat Behind” entre muitas outras, o fim aproximava-se em ambiente de total ramboia e foi com um divertido “I’d Rather Dance With You” que os noruegueses saíram de palco. Mas as palmas, os gritos, o bater do pé foram tão altos que eles não resistiram e voltaram. Ou melhor, voltou Bøe que silenciou e maravilhou o Coliseu para (en)cantar uma versão muito própria de “Corcovado” de Tom Jobim. Um português timido, trémulo mas encantador vestiu a canção com nova vida. Sempre bem disposto confessou que se estavam a divertir muito e que, por isso iam cantar mais umas quantas. Chamou os colegas e o encore estava garantido para tocar a esquecida “Cayman Islands”. Agradeceram, saíram e deixaram saudades logo no minuto a seguir.

Ficou comprovado que quando se é muito bom a fazer o que se faz, não são necessários atributos secundários para embelezar o por si só já é bonito. Música e vozes afinadas, muito afinadas e em perfeita harmonia são o forte dos Kings of Convenience. Simples e lindo, encantador e mágico foi o ambiente que se viveu ontem à noite no Coliseu durante quase duas horas. E podia ter durado mais porque estávamos como se estivessemos em casa, na sala, relaxados no sofá a contemplar uma coisa bela, que se vê, ouve e... sente. Thank you!

Kings of Convenience, Rule My World


(esta é a faixa número 5 do álbum novo, especialmente referenciada por Eralend Øye e que ontem teve uma versão mais funky. Mas o original é igualmente bonito)

6 comments:

ANÓNIMO said...

Cá o Anónimo viu-os pela primeira vez e ficou deslumbrado. O texto da nossa Mary faz todo o jus ao acontecimento. Memorável!!!

Alda Couto said...

Fiquei convencida :), primeiro com o texto, depois com a música. Muito bonita :)

mary said...

Está lindo minha marianita ;) e a música é qualquer coisa de maravilhosa ( e que ouvi hoje em loop durante a viagem)

joao said...

tenho por hábito ler as crónicas de concertos, mesmo daqueles que não assisti. é um exercício de imaginação. tento desenhar o que terá acontecido.
através deste texto, creio que escrito pela mariana, fico com a certeza de não ter perdido nada. o texto está mal escrito, as palavras repetem-se e quase que se afogam umas às outras, carregado de “embelezamento”, “alma”,” intimismo” e quejandos, digno de quem arrancou as folhas ao dicionário da laurinda alves.

Alda Couto said...

Que bom existirem estes especialistas que nos abrem os olhos e nos mostram a perfeição da coisa :). Especialistas e futuristas! Muito à frente! Sem repetições; sem aspas à francesa; sem maiúsculas! Não conheço o dicionário da Laurinda Alves mas tenho de reconhecer a extrema importância, pelo vanguardismo, do dicionário do joão aqui de cima, porque não é todos os dias que se assiste à mutação de adjectivos, tipo «quejandos», em nomes! Notável!

leididi said...

Pois que assim de repente não me parece que este blog tenha um carácter jornalístico, pelo que os textos não têm de ser isentos e livres de adjectivação. Eu não fui ao concerto - com muita pena minha - mas por esta descrição fiquei ainda com mais pena porque percebi que foi muito bom. E também percebi que a Mariana, autora do texto, gostou muito do concerto. E isso não tem problema nenhum, porque isto não é o um jornal online, é um blog pessoal, INTIMISTA e, porque não dizê-lo só para chatear um bocadinho, com ALMA. Dos autores, pois claro. Antígona rules.

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